Durante a missa de encerramento do Grito dos Excluídos, domingo (04.09), às margens da Lagoa da Viúva, no bairro Bom Jardim e Siqueira, o padre Rino Bonvini destacou as palavras do papa Francisco na defesa do meio ambiente: “O urgente desafio de proteger a nossa casa comum inclui a preocupação de unir toda a família humana na busca de um desenvolvimento sustentável e integral, pois sabemos que as coisas podem mudar”.

O papa recorda que “o Criador não nos abandona, nunca recua no seu projeto de amor, nem Se arrepende de nos ter criado. A humanidade possui ainda a capacidade de colaborar na construção da nossa casa comum”.

O ponto alto da mobilização foi o ofertório da missa, quando vários participantes plantaram mudas de árvore em frente à lagoa, iniciando ali um reflorestamento do lugar. Crianças, jovens, adultos e idosos, cada geração deixou ali sua reverência e compromisso com a mãe terra.

Ao final, o padre Rino convidou os presentes a assumirem um compromisso com a ecofilia, uma relação de amizade com a natureza, e com a ecologia sintrópica que propõe hortas, pomares e reflorestamento sincronizados com a sustentabilidade ambiental. Rino lembrou da necessidade de desenvolvermos uma relação harmoniosa com vegetais, animais e até com os minerais para ter uma terra saudável. Também questionou os usurpadores da democracia e a necessidade de atitudes cidadãs em favor dos excluídos e da promoção de vida plena.

Nas falas de encerramento, Rogério Costa, do Centro de Defesa da Vida Herbert de Souza (CDVHS) relembrou a luta dos movimentos sociais e organizações comunitárias em defesa do Parque Lagoa da Viúva. Ali, são quase 40 hectares de área verde, reunindo duas lagoas e a área verde chamada Pulmão Verde do Siqueira. Lembrou da conquista do prêmio Gentiliza Urbana, concedido pelo Instituto dos Arquitetos do Brasil (IAB), Ceará, à Comissão Moradia Digna e Meio Ambiente da Rede DLIS.

Elizeu de Sousa do Movimento Saúde Mental Comunitária (MSMC) recordou a soma de forças em defesa da lagoa, lembrou também que o Movimento em 2009 recebeu a mesma premiação do IAB, quando deu o exemplo e incentivou o cultivo de jardins e a arborização de moradias do Bom Jardim. Destacou que esta é uma oportunidade de os moradores voltarem a plantar ervas medicinais, jardins e adotar uma planta em suas casas, numa relação de ecofilia.

Na ocasião, foi apresentado um frasco do elixir de erva-cidreira, calmante natural, produzido a partir do cultivo dessa planta medicinal na horta do MSMC. Elizeu também convidou todas as pessoas a praticarem a permacultura, uma forma de aproveitar materiais descartáveis, replanejar os ambientes e utilizar recursos renováveis, que pode começar com o reuso de garrafas pets para jarros e hortas.

José Santana, do MSMC, lembrou a importância do cultivo de plantas como a Moringa que além filtrar a água, tem importante valores nutritivos. Após coletar sementes ali ao redor da lagoa, José disse que é preciso aproveitar essas sementes para replantar quintais e áreas degradadas dos nossos bairros. Ele trabalha a agroecologia sintrópica que resgata a sustentabilidade do meio ambiente.

A missa realizou-se próximo ao meio dia. Antes, logo cedo, pelas 8h da manhã, moradores, integrantes de movimentos sociais, de pastorais, das Comunidades Eclesiais de Base, fizeram concentração na praça da Igreja Santa Cecília. Em seguida, todos juntos, saíram caminhando, cantando e bradando por direitos humanos, saúde integral, saneamento básico e uso sustentável da água.

O MSMC, a Rede de Desenvolvimento Integrado e Sustentável (Rede DLIS), o Centro de Defesa da Vida Herbert de Souza e a Paróquia de Santa Cecília contribuíram para a mobilização, envolvendo grupos sociais e pastorais dos bairros e comunidades da região de Fortaleza chamada de Grande Bom Jardim.

Os gritos da comunidade

Protestos exigiram “Foram Temer” e respeito aos negros, às mulheres e aos direitos humanos. Falas denunciaram o estado de abandono da periferia, numa cidade em que apenas 54% da população conta com saneamento ambiental e esgotamento sanitário. Comunidades como o Marrocos padecem da falta de pavimentação, saneamento e condições habitacionais dignas.

Durante o trajeto, crianças do projeto Sim à Vida (do MSMC) moradoras do Marrocos, acompanhadas de seus educadores, uniram-se às fileiras da marcha da cidadania. O envolvimento das crianças contribui para o desenvolvimento da consciência cidadã.

Mais adiante, uma parada para falas em defesa do direito à moradia, em frente à ocupação Povo Sem Medo, do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST), na avenida Urucutuba. Ali, instalaram-se milhares de pessoas em busca da conquista da moradia.

Outras paradas para reflexão se deram, numa delas, diante do habitacional Miguel Arraes, onde houve a partilha de algumas mudas de árvores. A caminhada dirigiu-se até o Parque Lagoa da Viúva. Ali, na principal área verde da região, foi celebrada a missa ao ar livre, presidida pelo padre Rino Bonvini.

Para a moradora Zenilce, as atividades realizadas no Grito dos Excluídos do Bom Jardim preencheram de maneira positiva as demandas levantadas pelos demais moradores: “Para nós do movimento popular é uma grande conquista e uma grande novidade, pois o 7 de setembro a gente só ouve falar para os ricos, e nós da comunidade junto com os movimentos sociais se organizamos para gritar por uma causa, que é o meio ambiente”.

O lema da edição deste ano do Grito dos Excluídos é “Este sistema é insuportável: exclui, degrada, mata!”, alertando sobre a agressão aos direitos humanos presentes na realidade brasileira, especialmente nas áreas urbanas de periferia.

“Nós estamos dizendo ‘não’ a todas as violações de direito: o direito da mulher, o direito do negro, o direito ao saneamento básico e todos os diretos que são violados na comunidade do Grande Bom Jardim”, afirma Silvelania Souza, participante da mobilização. O Grito dos Excluídos ocorre no dia 7 de setembro. Este ano, o ‘Grito’ será realizado no bairro do Jangurussu, pela manhã.

 

Sobre o Movimento Saúde Mental

Fundado em 1996, o Movimento Saúde Mental atua, entre outras coisas, com grupos de terapia comunitária, embasado pela Abordagem Sistêmica Comunitária, e desenvolve atividades para todas as faixas etárias no bairro Bom Jardim, em Fortaleza e bairros vizinhos.