A data discute a reforma no sistema psiquiátrico do Brasil e as melhorias necessárias no cuidado à saúde mental / FOTO: Arquivo MSM

 

A Palhoça Comunitária do Movimento Saúde Mental (MSM) recebeu a comunidade do Bom Jardim e convidados/as para celebrar o Dia Nacional da Luta Antimanicomial com a semana “Em casa sim! Sem liberdade nunca mais!”, que ocorreu entre os dias 19 e 23. A programação acolheu os/as participantes em momentos de cuidado e terapia, exibição de filmes e documentários com a temática abordada e oficinas artísticas, com o intuito de falar sobre as mudanças no tratamento psiquiátrico, principalmente em relação às práticas integrativas, além de dialogar sobre a inclusão e o trabalho contínuo na conscientização de melhores condições para as pessoas em tratamento psiquiátrico.

Por meio das ações do MSM na prevenção e acolhimento de pessoas com doenças psíquicas, a coordenadora da Palhoça Comunitária do MSM, Ana Paula Fernandes, avalia que a importância do evento está em voltar o olhar para a luta pelos direitos à saúde mental humanizada e de qualidade, para além do cuidado médico. “[…] Não é só a medicação, mas também o cuidado que vem através das Práticas Integrativas e Complementares em Saúde, dos grupos terapêuticos, da integração no serviço, no aprendizado de uma nova atividade como aula de violão, bordado… fazer com que essas pessoas socializam entre si e busquem um novo horizonte em suas vidas”, diz.

Como evento principal da semana, na quarta-feira (21) foi realizada a roda de conversa com o mesmo título da semana, trazendo a participação de terapeutas, profissionais, atuantes políticos da saúde mental e ativistas da causa.  Além de Ana Paula, estiveram presentes Eliza Gunther, da Fundação Silvestre Gomes idealizadora do bloco Doido é Tu; Sarah Lima Verde, assessora técnica da Coordenadoria de Políticas em Saúde Mental da SESA; e Ana Paula Costa, terapeuta ocupacional do CAPS Comunitário do Bom Jardim.

 

 

Mediada pela terapeuta ocupacional Glaucia Cavalcante, a discussão guiou-se a partir da importância de comemorar a data, além de contar um pouco sobre contextos históricos e as mudanças, principalmente no Estado do Ceará. A mesa ainda discorreu sobre o trabalho dos manicômios e a desumanização dos/as pacientes que passaram pelas instituições. 

Ao falar sobre o fechamento do Instituto Psiquiátrico Governador Stênio Gomes, último manicômio a funcionar no Estado, Sarah Lima evocou a eficácia de tratamentos menos invasivos e destrutivos, como a internação, mostrando que existem outras maneiras de se tratar transtornos psiquiátricos. “Todos os nossos esforços são para não internar, porque acreditamos que aqui fora transformações acontecem”, declara.

Ana Paula Fernandes ainda reitera as ações do MSM, que através das Práticas Integrativas e Complementares em Saúde (PICS) promovem autoestima, autoconhecimento e transformação na comunidade desde 1996. “Fazer com que as pessoas tenham amor à vida de novo é nossa maior vitória”, acrescenta a coordenadora.

A Luta Antimanicomial iniciou na década de 70 e marca a reivindicação de profissionais da saúde por melhorias de gestão e ações voltadas para a saúde mental no âmbito psiquiátrico, se caracterizando inicialmente por ir contra o funcionamento de manicômios e levantando a bandeira do combate ao estigma e à exclusão de pessoas que sofrem de transtornos mentais, ressaltando o direito à liberdade.

 

LIBERDADE E FESTA

Falar da Luta Antimanicomial é, acima de tudo, falar da valorização da vida. A “demolição” dos muros dos manicômios também trouxe o surgimento de espaços onde a discriminação dá lugar à celebração da diversidade. Com muita música e folia, o bloco Doido é Tu reúne os/as usuários/as dos Centros de Atenção Psicossociais de toda Fortaleza, no tradicional desfile no carnaval da cidade. 

 

 

 

Eliza Gunther, idealizadora do bloco, conta que a partir do seu trabalho como arteterapeuta no CAPS, viu o potencial artístico dos/as usuários/as e em 2008 surgiu o primeiro convite para desfilar na Avenida Domingos Olímpio como bloco de sujo. “O bloco de sujo é aquele que não tem uma estrutura de alas, não tá dentro do desfile oficial. Então a gente juntou aí já umas 150 pessoas mais ou menos e fomos para Domingos Olímpio. Na época eu consegui um trio elétrico e foi muito muito legal, assim, a gente fez as ruas do entorno”.

Foi então que em 2010 o Doido é Tu junta-se aos blocos históricos de Fortaleza, desfilando oficialmente na competição de carnaval. Trazendo a Estamira como temática, desde então virou tradição contar histórias sobre a saúde mental, levando não só diversão, mas conscientização para a avenida. De lá pra cá, foram conquistados 5 campeonatos e o coração do público. O que no começo era visto como piada, se tornou o bloco mais aguardado por quem acompanha os desfiles. “Nos dias do desfile do Doido é Tu, tem pesquisa do jornal O Povo que diz que é o bloco mais aguardado. E isso muda muito a mentalidade das pessoas, que sempre veem as pessoas com transtorno mental como uma pessoa incapaz, como uma pessoa que tem que estar trancafiada muitas vezes”, acrescenta Eliza.

 

 

O Doido é Tu representa tradição, representatividade e um grito de liberdade. É a celebração daqueles que são estigmatizados e o testemunho de que são capazes de viver sem se limitar. A alegorista, o alegorista, a bateria e sua rainha são compostas pelo protagonismo e o talento dos usuários do CAPS, que levam muito mais que beleza para o desfile.

 

Por Richardson Lael