(Padre Rino Bonvini é homenageado com placa “Guardião dos Pitaguary” / Foto: Yago Medina)

 

Em alusão ao Dia do Indígena Pitaguary, a Prefeitura de Maracanaú, por meio da Secretaria da Agricultura Familiar e Assuntos Indígenas, homenageou como Guardião Pitaguary, nesta quarta-feira, 12, o presidente do Movimento Saúde Mental (MSM), padre Rino Bonvini, pela sua contribuição para a preservação da cultura e espiritualidade do Povo Pitaguary. Desde 2007, o padre Rino desenvolve ações e projetos como o Iandê Memé Maranongara, o Sim à Vida, o Juventude Indígena Realizando Sonhos, apoio à construção da palhoça na comunidade do Santo Antônio no território indígena. São ações que contribuem para o fortalecimento da identidade étnica Pitaguary junto às novas gerações. 

 

A realização do projeto Iandê Memé Maranongara, que na língua Tupi significa “Somos Todos Parentes “, destacou a visão universal desenvolvida milenarmente pelos Lakota Sioux por meio da expressão Mitakuye Oyasin, que tem o mesmo sentido descrito acima. O padre Rino é adotado pelos Lakota Sioux como um irmão. Já o projeto Sim à Vida contribui para prevenção às dependências, para o fortalecimento da autoestima e das raízes culturais Pitaguary. O projeto Juventude Indígena Realizando Sonhos direcionou, durante anos, um grupo de jovens indígenas Pitaguary para escolas referências em educação, incentivando-os a seguirem na vida acadêmica após a finalização do Ensino Médio. Por essas e outras ações, o padre Rino Bonvini recebeu a placa “Guardiões Pitaguary”, em reconhecimento aos 17 anos de trabalho dedicados aos Pitaguary, em especial, à atenção à saúde mental. 

 

O Dia do Indígena Pitaguary completa hoje três anos desde sua criação, tendo sido instaurado pela Câmara Municipal de Maracanaú através da Lei Nº 3.042, de 18 de Junho de 2021. Neste ano, padre Rino foi um dos 15 homenageados. Para Neto Pitaguary, liderança indígena, a homenagem é um reconhecimento ao trabalho realizado junto ao povo Pitaguary nos municípios de Maracanaú e Pacatuba. “Esse ano, ele [padre Rino] recebe essa placa em reconhecimento a todo esse trabalho empregado na defesa da criança e do adolescente, sobretudo, potencializando as questões artísticas, culturais, de desenvolvimento humano e de desenvolvimento familiar, para que o povo indígena Pitaguary, por meio dessas crianças e adolescentes, consiga ter vida”.

 

Entre os homenageados do dia, também receberam a placa o Governador do Estado do Ceará, Elmano de Freitas; o Superintendente do Instituto de Desenvolvimento Agrário do Ceará (IDACE), João Alfredo Telles; o Prefeito de Maracanaú, Roberto Pessoa; o Pároco da Paróquia de São José de Maracanaú, José Sávio; além de lideranças indígenas, profissionais da saúde e professores. Neto Pitaguary destaca a data como um “marco muito importante, que nós consideramos como um grande avanço dentro dessa política de estruturação desse avanço. É um reconhecimento a esse trabalho que o Movimento Saúde Mental desenvolve dentro da terra indígena Pitaguary”.

 

O evento, que reuniu representantes políticos, sociedade civil e lideranças indígenas,  contou ainda com a realização do ritual ancestral, aos pés da Mangueira Sagrada. A música ficou por conta dos adolescentes da nova geração indígena, que aprenderam, em sua maioria, os cânticos em Tupi, graças às ações desenvolvidas pelo projeto Sim à Vida, do MSM. Entre os representantes que compareceram à solenidade, destaca-se a presença do Vice-Prefeito de Maracanaú, Neton Lacerda; do Deputado Estadual, Firmo Camurça; além de secretários e representantes do Governo do Estado do Ceará, do Distrito Sanitário Especial Indígena do Ceará (DSEI-CE), da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), do IDACE, de caciques e pajés, das lideranças das comunidades do Horto, do Santo Antônio, do Olho D’água, da Munguba e, sobretudo, pela presença marcante do povo Pitaguary.

 

(Desde 2007, padre Rino Bonvini realiza ações e projetos para o fortalecimento da ancestralidade Pitaguary entre as novas gerações / Foto: Yago Medina)

 

Durante sua formação teológica, em 1994, padre Rino foi adotado pelo povo Lakota Sioux, dos Estados Unidos, sendo batizado como Oyate Oyshakia Mani, que se traduz como “Aquele que Caminha Ajudando o Povo”. Na cultura Lakota, isso designa a Rino a missão de fortalecer seus irmãos indígenas. Em seu caminhar junto aos Pitaguary, no Brasil, padre Rino Bonvini foi responsável por promover o encontro entre a cultura Lakota e a cultura Pitaguary. A vivência resultou em uma partilha cultural e espiritual entre alguns indígenas desses dois povos, que mantêm uma conexão que se estende até os dias de hoje.

 

Chamada de Terra da Luz, por ter sido a primeira província brasileira a abolir a escravidão, o Estado do Ceará tem forte  marca deixada por colonizadores, pois ainda no século XIX, a província também “foi a primeira a negar a existência da presença indígena em seu território”, de acordo o site Povos Indígenas no Brasil. Como resultado, o controle do Estado sobre os povos originários foi marcado por um violento processo de apagamento identitário dos povos indígenas no Ceará que, até hoje, lutam para promover sua cultura, identidade e seus direitos.

 

Ao longo de sua vida, o médico, psiquiatra e padre missionário Comboniano, Rino Bonvini, sistematizou uma metodologia socioterapêutica multidisciplinar e de múltiplo impacto que tem como objetivo ajudar na superação da Síndrome da Colonialidade Internalizada, nomeada de Abordagem Sistêmica Comunitária (ASC). Desde 2007, ASC é desenvolvida nos territórios indígenas Pitaguary dos municípios de Maracanaú e Pacatuba, ajudando as pessoas a superar estigmas e a alcançar o protagonismo, com fortalecimento da autoestima e evolução pessoal e comunitária.

 

O projeto Sim à Vida, realizado em Maracanaú, é um dos exemplos das ações que o Movimento Saúde Mental tem realizado na luta pela preservação das tradições e da identidade do povo Pitaguary. O projeto atende crianças e adolescentes em três núcleos no território indígena – Horto, Olho D’água e Santo Antônio. As práticas diárias são voltadas à atividades de relaxamento, fortalecimento da autoestima e desenvolvimento das múltiplas inteligências, incluindo a intrapessoal e a interpessoal. A ação traz resultados transpessoais e transculturais. Nas atividades se destacam o grafismo, o toré (dança tradicional) e as histórias dos povos originários. Além disso, a nova geração está retomando estudos da língua Tupi-Guarani, através da musicalidade. 

 

Atualmente, em Maracanaú, o projeto Sim à Vida é realizado em cogestão com a Secretaria de Assistência Social e Cidadania da Prefeitura de Maracanaú, com apoio do Sistema Único de Assistência Social (SUAS) do Governo Federal. A cultura indígena é a base para o desenvolvimento das atividades com as 90 crianças e adolescentes Pitaguary. O projeto acolhe crianças e adolescentes de 5 a 14 anos, de famílias inscritas no Cadastro Único. Os beneficiários habitam áreas de vulnerabilidade social de Fortaleza e Maracanaú. 

 

GALERIA DE FOTOS

 

 SOBRE A ABORDAGEM SISTÊMICA COMUNITÁRIA

 

A ASC é um sistema socioterapêutico multidisciplinar e de múltiplo impacto, que atua na prevenção do sofrimento psíquico e existencial. Organizada sob três princípios – Autopoiese Comunitária, Trofolaxe Humana e Sintropia -, a Abordagem Sistêmica Comunitária foi reconhecida, em 2009, como tecnologia socioterapêutica efetiva e replicável pela Fundação Banco do Brasil de Tecnologia Social. Já em 2018, a ASC foi considerada uma inovação em Saúde Mental pelo MHIN (Mental Health Innovation Network) – vinculado à Organização Mundial da Saúde. 

 

Redação por Gabriele Félix e Elizeu Sousa
Fotos por Yago Medina